ESCRITOS DE JOAQUIM SÍLVIO CALDAS

Escritor, cronista e apaixonado por Natal
RN

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quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

"Deus" existe e é daqui

“Deus” existe e é daqui






Isso mesmo. Mas não me refiro ao Deus eterno, e sim a um “Deus” de carne e osso, nascido aqui, na terrinha e que foi colega de farra em Recife não apenas do grande Jahyr Navarro, mas de um ex-professor e amigo meu, o doutor-professor Bento Ferreira de Carvalho, que além de médico era naturalista e grande boêmio, falecido há pouco.

Pois foi do doutor Bento que recebi a primeira referência sobre Deus e, à época, a crônica dizia que o apelido de Ivanildo Correia Paiva era atribuído ao fato de ele, como o Pai Eterno, ter o dom de se encontrar em toda parte. Pelo menos em Recife da década de 1950. Isto é, não tinha festa ou comemoração em que “Deus” não se fizesse presente. Freqüentador assíduo de todas as boates promovidas pelos clubes tradicionais da cidade, tais como Internacional, Português, Sport, Náutico, Caxangá, Country Club e outros menos cotados como Atlético, além de outros menos cotados ainda, como as gafieiras de Camaragibe, Coque, Afogados ou Macaxeira, lá estava ele, “Deus”, irradiando sua eterna simpatia. Como ele adentrava nas tais festinhas? O doutor Jahyr nos deu um exemplo em sua crônica de segunda-feira, 1 de fevereiro.

Para atender aos apelos sociais da época, até “smoking” pedia emprestado aos colegas mais bafejados pela sorte. Contanto que não perdesse um baile de formatura. O único clube do qual era realmente sócio era o Clube Universitário, do qual justamente Bento, à época, era presidente. Não sei se “Deus” chegava a pagar alguma contribuição, mas que era sócio, isso era.

Um dia, exercendo eu a função de juiz classista, em Recife, presente à audiência defendendo um operário, lá estava o doutor Ivanildo. Figura humilde, simpática, de fácil convivência. De logo surgiu um acordo entre as partes, sugerido por ele próprio. Feitas as pazes entre os até então litigantes, “Deus” me chama à parte e se identifica.

- Doutor, gostaria de me apresentar. Sou muito amigo de um seu ex-professor, o doutor Bento Carvalho, que me falou sobre o senhor. Mas disse que o senhor já me conhecia, pelo menos de nome.

- Bem, doutor Ivanildo, creio que o professor Bento cometeu um engano, pois nunca ouvi falar do senhor.

- Ouviu, sim senhor, só que com outro nome.

- E o senhor tem outro nome, por acaso?

- Por acaso, tenho, sim senhor: meu nome é “Deus”.

- Ah, já ouvi falar muito do senhor mesmo.

E entre uma gargalhada e outra saímos para um reservado, onde saboreamos um cafezinho e passamos o final de tarde relatando estórias dos tempos estudantis.

Muitos anos depois, juiz do trabalho trabalhando aqui no Estado, um dia noto que uma figura está parada ao meu lado, enquanto eu estava fazendo uma delicada instrução. Viro-me, e não posso conter o riso. Os advogados presentes, acostumados com meu cenho normalmente sério, ficaram espantados. Levantei-me, apertei-lhe a mãos e apresentei-o aos demais presentes.

- Senhores, tenho a honra de apresentar-lhes, nada mais, nada menos, que o doutor “Deus”.

Todos da sala continuaram sem entender bulhufas.

“Deus” continuava o mesmo, com a magia da sua simpatia e da sua facilidade de cativar as pessoas.

Agora, para surpresa minha, eis que “Deus” foi colega de farra do meu amigo, o doutor Jahyr Navarro, que egoisticamente ainda não enfeixou suas saborosas crônicas em um livro, para deleite de todos nós.

- “Deus”, esteja onde estiver, me procure para matarmos um pouco da saudade daqueles idos.

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