Refiro-me à década de 1950. Morávamos no bairro da Torre, em Recife, na casa da minha santa avó. Minha mãe obedecia rigorosamente o jejum da sexta-feira. Só era permitido beber água.
Na nossa modestíssima despensa, pedaços de bacalhau e bandas de côco seco para distribuir com os mais pobres que costumavam naquele dia bater à nossa porta.
Por volta do meio-dia sentávamos à mesa e, antes do almoço meu pai escolhia um trecho da Bíblia e me mandava ler para os presentes. Morto de vergonha, cumpria timidamente a ordem paterna, que ordem de pai, naqueles tempos era para ser cumprida.
Passado o vexame da leitura os pratos chegavam fumegantes à mesa. Feijão, arroz, bredo, bacalhau e peixe – tudo de côco. Embora fosse ainda criança, mas meu prato era de adulto. Juntava a fome com a vontade de comer. Acho que meu pai não reclamava por compreender a justificativa do meu apetite, além da saborosa culinária da minha mãe e da minha avó.
Meu pai, naquele dia, dispensava a cerveja e servia a todos um vinho barato, sendo que para as crianças era servida uma sangria (vinho misturado com água e açúcar).
À noitinha normalmente nos dirigíamos à Igreja da Torre para assistir à Missa e em seguida para o jantar, onde nos reuníamos, como de costume. Em seguida, a conversa dos adultos na calçada e as brincadeiras de roda das crianças na rua.
No dia seguinte vinha o sábado de Aleluia: brincadeiras adultas de serra-velho, que algumas terminavam na delegacia de polícia, e o linchamento dos Judas, bonecos de pano que a rapaziada mais velha vestia nos bonecos manufaturados durante a semana para enforcá-los e torná-los em frangalhos, logo cedinho, ao lado do pau de sebo, brincadeira que meu pai estimulava pendurando ao mesmo uma cédula de cinco cruzeiros, bem novinha, para o moleque que conseguisse subir na madeira ensebada.
Porém hoje os tempos mudaram, e tudo ficou nos escaninhos da memória.
terça-feira, 30 de março de 2010
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