ESCRITOS DE JOAQUIM SÍLVIO CALDAS

Escritor, cronista e apaixonado por Natal
RN

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quarta-feira, 21 de abril de 2010

O amigo da onça

O amigo da onça








No Brasil até as tragédias às vezes são hilárias. Enfim, parece mesmo não ser um país sério, conforme o francês De Gaulle.

Há tempos o jurista e meu amigo de faculdade José Paulo Cavalcanti escreveu sobre um crime então inafiançável ocorrido nos confins do sertão Nordestino, consistente numa prisão em flagrante de um matuto que matara um tatu-peba para matar a própria fome. Transferido algemado para uma delegacia do Recife, há cerca de 600 km de casa, o pobre homem sequer assuntava sobre o que estava se passando na vida dele. Não fora Zé Paulinho assumir a causa do pobre diabo, até hoje deveria estar mofando pelas cadeias da vida.

Na ocasião, em competente artigo na revista Veja nosso jurista comentou: tivesse o pobre homem atirado no guarda que o prendeu, livrado o flagrante, iria responder o processo em liberdade, pois assim diz a Lei. O erro dele foi deixar o guarda vivo e se deixar prender pelo “assassinato” do tatu-peba.

Devo esclarecer que à época quem matava animal silvestre cometia crime inafiançável. A legislação evoluiu um pouco nesse sentido.

Mas o motivo dessa lera é outro.

Um matuto, em plena selva amazônica, foi atacado por uma onça. Teve a sorte de conseguir se defender e matou a onça. Preso, levou logo uma lição de moral do guarda florestal.

- O senhor compreende a gravidade do crime que cometeu?

- Eu? – indagou o pobre homem.

- Sim senhor, o senhor assassinou um animal silvestre que é protegido pela nossa legislação!

- Mas ‘seu’ guarda, era ela ou eu. A onça estava querendo me comer. Tive que matá-la pra me defender.

- Só que o senhor não podia ter matado a onça. Ela é protegida por Lei, portanto, o senhor vai ter que responder a um pesado processo e é bom ir contratando logo um bom advogado.

‘ - Advogado? Eu? – Ora, ‘seu’ guarda, não ganho nem para o leite das crianças, quanto mais pra contratar advogado.

Pobre homem, não sei o que fará para se safar. Tão longe, lá na distante Amazônia, não dá nem para eu pedir a Zé Paulo que lhe faça a caridade.

E o pior é que o tal guarda, ouvi dizer, é um autêntico amigo da onça.

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